«(...)Haverá um vidro que vai continuar partido numa janela, uma lâmpada fundida num candeeiro que se deixou de utilizar, um telemóvel sem serviço, o condomínio mais um ano por pagar, um farol do carro por arranjar, um jornal que se deixou de comprar, um tapete estragado que continuará estragado, uma camisola gasta que se usa puída, uns sapatos velhos demais, uma vida cansada demais. (...)»
Pacheco Pereira, in Público, 18.12.2010 «2011: ano nefasto»
Em termos literários a descrição poderia ser mais rica. Pouco importa, é suficientemente ilustrativa. Não é disto mesmo que todos receamos para 2011, e aqueles que lhe seguirão? No dia 31 de Dezembro, deveríamos poder congelar este ano agora a chegar ao seu final infeliz, e saltar por cima dos que aí vêm, caindo no primeiro que se afigure menos doloroso (e acredite-se que nem falo por mim, que sou uma privilegiada).
Dito isto, os meus primeiros 12 votos para 2011 (pode não se seguir uma nova série, but no promisses):
1. Que ninguém ouça «podíamos fazer uma radiografia, mas com isto da crise, olhe, vá para casa e veja se lhe passam essa dores, senão volte cá»;
2. Que ninguém pense, «ganho menos, vou trabalhar menos»;
3. Que ninguém diga, «fujo aos impostos, claro, sou eu sempre que sofro na pele os seus aumentos»;
4. Que ninguém acredite que, irem-se-nos os dedos com a China é muito melhor que irem-se os anéis com o FMI;
5. Que a classe média portuguesa não comece a escolher o McDonald's para festejar os grandes acontecimentos da sua pequena «vida cansada» (esta cadeia de fast food atingiu lucros recordes em Outubro deste ano), por ser mais barato;
6. Que as escolas não hajam de abrir ao fim de semana para darem pelo menos uma refeição por dia, a cada vez mais crianças...ah, isso já acontece...que tenham, então, as Câmaras pelo menos dinheiro para o continuar a fazer;
7. Que não acabem as luzes de Natal em nome da austeridade (se quiserem aboli-las, tudo bem, mas se por causa da austeridade, será muito mau sinal).
8. Que os Centros de Emprego não hajam de reforçar ainda mais os recursos humanos afectos ao atendimento de desempregados em profundo desespero;
9. Que as «lojas dos trezentos» não sejam as que registem maiores volumes de venda no final do ano;
10. Que a Rita, filha da empregada da X., possa receber uma nova boneca no Natal, porque à X. não cortaram mais ainda o ordenado, obrigando-a a dispensar a mãe da Rita, que trabalha lá em casa há vinte anos.
11. Que o voluntariado triplique se triplicarem os que dele necessitem, em virtude de o Estado - depois de se ter exaurido no que não devia - não poder já deitar-lhes a mão.
12. Que em todas as próximas eleições nos consigamos abster de encher os boletins de voto de palavras desabonatórias dos nossos governantes e oposição (qualquer que seja, mas sempre perversamente cúmplice no presente, como no passado e no futuro).
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