Espaços de solidão física

As fobias são como os insectos. De vez em quando lá aparece mais uma identificada. A nova chama-se "nomofobia" e traduz-se no receio de ficar incontactável por telemóvel.

Vivemos num mundo em que é suposto estarmos sempre contactáveis, isto porque, segundo Júlio Machado Vaz ("Amor é", de segunda feira passada), de repente, transformamos em urgências, assuntos que o não são. Se alguém se lembra de qualquer coisa, acha que tem de o partilhar de imediato. É a dificuldade de estarmos sozinhos connosco próprios, conclui.

Dei comigo a pensar que esta necessidade instalada de partilha nos faz actuar a todos, e em relação a cada vez mais pessoas, da forma que ainda há uns anos era própria quase exclusivamente de uma relação bilateral de apaixonados, carentes de pretextos para comunicar e acabarem por estar fisicamente um com o outro.

Hoje, enfatizamos mais o objecto da partilha (e de preferência de algo rápido que não mereça demasiada reflexão ou quanto muito um brevíssimo comentário, como a imagem, o vídeo, a "fofoca", a curiosidade, a notícia), sendo que só em alguns casos isso vem na sequência de um anterior "estar físico" com essa pessoa, ou desse objectivo final. Dir-se-ia que, cada vez com mais facilidade, substituímos amigos por "contactos".

Nem de propósito, hoje passava os olhos pela Ípsilon, e sobre a sua primeira longa metragem "Os Famosos e os Duendes da Morte", dizia o realizador, Esmir Filho, ter concluído das pesquisas fizera para o filme:

"(...) e a internet é quase um paliativo para a solidão. É como a alegoria da caverna de Platão: você está ali, vê um mundo, liga-se, tem uma certa satisfação, desejo, sedução. Mas a internet tira-nos um pouco do mundo físico, e esse lado físico é uma necessidade (...) A internet é um espaço de solidão que não tira a angústia (...)".

E acrescentava que lhe diziam, quando fizera aquela investigação, que com a internet era mais fácil viver no interior brasileiro. "Mas eu não sentia isso, sentia uma angústia nas pessoas. Eu próprio tive amigos virtuais com quem falava coisas muito mais reais do que com o meus amigos de verdade. Mas é um computador a falar connosco, dá a sensação que você está a falar consigo mesmo..."

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