Entre a espada e a espada
No caderno principal do Expresso desta semana, o Senhor de quem se fala, Poul Thomsen, chefe da missão do FMI em Portugal diz, sobre o facto de alegadamente o programa da troika (afinal) não impor corte nos salários dos privados:
"(...) não é uma imposição do programa corte nos salários do sector privado, mas convém lembrar que Portugal tem um problema de competitividade que deve ser resolvido. Existem duas formas de o corrigir. Reduzir salários, o que significa que o país fica mais pobre, ou tornar-se mais produtivo. A forma preferida é pela produtividade".
Sobre o mesmo assunto, diz João Vieira Pereira, friamente, na página 31 do Caderno de Economia do Expresso:
"O ajustamento salarial da economia portuguesa é neste momento inevitável. Existem duas formas de o fazer. Ou esta redução é rápida e voluntária preservando postos de trabalho ou é feita gradual e automaticamente por via do aumento do desemprego.
Não é preciso ser um génio para perceber que a primeira forma é muito melhor. Até porque se a crise continuar por muito mais tempo, outra coisa inevitável será o aumento de impostos para sustentar o nível de despesa, o mesmo que dizer menos salários
É por isso urgente que o governo faça uma revisão imediata do código do trabalho para permitir uma maior flexibilização, enquadrando não só a possibilidade de redução de salários mas também o despedimento em determinados casos. A escolha agora é entre algum emprego e nenhum (...)".
Algumas páginas atrás do mesmo caderno, Nicolau Santos escreve quase a mesma coisa, mas num registo entre o indignado e o sarcástico:
"Os troikianos vieram dizer as suas verdades. A primeira, é que o modelo económico português deve assentar em salários baixos. É uma ideia brilhante que nunca testámos por aqui. Os chineses já estão a tremer de medo. A segunda é que o corte de subsídios de férias e de Natal no sector público tem de ser aplicado ao sector privado. Será que não estudaram economia? O sector privado já há muito que se está a ajustar, com o disparo no desemprego e nas reduções salariais.O corte nos subsídios vem já a seguir (...)".
Podia dizer-se que ainda ontem o FMI falou, e hoje já está tudo com este discurso.A verdade é que se somos tão rápidos a focar a questão, em registos mais crus ou mais indignados, é porque percebemos claramente, que Thomsen diz aquilo que todos já intuímos: que o aumento da produtividade é, em Portugal, uma miragem crónica de séculos, que sempre pôs em causa a nossa competitividade por outra via que não a dos baixos salários.
É evidente que o FMI não acredita em Portugal, por isso avança com a ideia da redução de salários e finge hipocritamente (enfim, faz o seu papel), que o aumento da produtividade é uma alternativa credível. Não tenhamos ilusões, a troika sabe à partida, que até somos capazes de trabalhar muito, leia-se com muito esforço, mas que nunca o faremos com suficiente ousadia, inspiração, eficácia e disciplina, de modo a conseguirmos uma relação justa, porque equivalente, entre o resultado desse trabalho e as boas remunerações.
Empobreceremos, portanto, através da redução dos salários porque as nossas elites empresariais e políticas são hoje, como sempre foram, medíocres. É uma inevitabilidade. Resta-nos apenas escolher a arma pela qual preferimos morrer, como (quase) diz João Vieira Pereira.
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