Portugal: aumento da tributação do valor confiança


Bem pode ter saído do Conselho de Ministros, reunido em sessões contínuas para aprovar o Orçamento do Estado para 2013, o anúncio da manutenção da clausula de salvaguarda para o IMI.

De nada valerá. Depois do episódio da TSU, depois do anúncio jurídica e socialmente repugnante da retirada precisamente da clausula de salvaguarda do IMI agora reposta, e do aumento draconiano de IRS a que seremos todos sujeitos em 2013, a cada dia que passa acontece no espírito dos portugueses uma avassaladora retenção na fonte da nossa confiança nas soluções que nos são apresentadas como redentoras.

Quando um governo é tão obviamente impermeável ao sofrimento do povo que o elegeu - e recuar em medidas que são infantilmente perversas não o torna mais permeável a esse sofrimento, apesar de ser meritório - é o Estado de direito que se desmorona, sendo certo que do seu bom funcionamento depende o pleno exercício de qualquer democracia.

A sensação é a de que passámos a viver num farwest momentaneamente sem xerife, ou com um filho toxicómano que, a qualquer instante, poderá revolver as gavetas mais recônditas da nossa casa, tentando encontrar nem que seja a letrinha em ouro da irmã mais nova para vender e adquirir a sua dose diária de droga. Tudo pode acontecer: o mau e o seu contrário, que se revelará igualmente mau.

Só resta saber até quando os portugueses vão preferir, tal como terá dito Goethe (citado in "A Alemanha sem Milagre - De Hitler a Adenauer", de Heinz Abosch, Portugália), "uma injustiça à desordem", acreditando no efeito benéfico que uma série infindável de injustiças terá no crescimento e desenvolvimento de Portugal, como se fossemos a Alemanha do pós-guerra do Chanceler Konrad Adenauer.

Esse seria um  acto de fé  que, como tal, corre por nossa conta e risco. É que, nem Portugal é a Alemanha do pós guerra, nem o povo português do pós-boom de crescimento (falseado, mas para o caso não interessa) é o povo alemão do pós-guerra.

Por conseguinte, a outra  hipótese, tanto mais provável quanto é certo que já nem o Papa da austeridade - o FMI - acredita nas vantagens da uma dose excessiva dessa droga, como lhe chama Paul Krugman, começaremos inevitavelmente a assistir a múltiplas e incontroláveis "manifestações de carácter de um povo" (de que falou eufemistica e até simpaticamente o Ministro Vítor Gaspar, perante os parceiros comunitários, a propósito das manifestações de 15 de setembro) afogado cada vez mais em desconfiança, desemprego, dívidas e desespero.  Manifestações essas que podem assumir cambiantes que nem me atrevo a antecipar.

Há uma ética de boa governança que Pedro Passos Coelho ignora olimpicamente, e para a qual se recusa a chamar a atenção dos nossos credores. E isso pode custar-nos tanto ou mais caro que os incomensuráveis dislates dos anteriores governos. Não vai ser bonito de ver, e muito menos de viver.

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