Fui ver «A turma» de Laurent Cantet . Tudo o que se pode achar que se vai ver e pensar, não acontece. Não estamos pré-formatados para considerar a hipótese de uma turma de jovens selvagens e rebeldes, de quem se consegue tirar pouco, pouquinho, ter sequer uma vaga chance de num dia remoto e improvável, se transformar em muito mais do que é no seu conjunto. Sócrates, o verdadeiro, explicaria; Sócrates, o engenheiro e sua ministra nunca atingiriam. Desatariam a contabilizar.
O filme brinca com as nossas «caixinhas»: já classificaste este aluno como o "mau" então vê do que ele é capaz! E este como o "bom" ? E este como "perdido"? E aquele como "improvável"? E esta professora como pateta? Pois então vê e pasma.
E tu, naquele lugar, serias qual dos professores, perguntamo-nos? (infelizmente, assumo, não me revejo no protagonista - mas no prof de história: cheio de razão mas absolutamente incapaz de alcançar o que só o esforço e empenho do Director de Turma (DT) é, afinal, capaz de nos revelar daquela miudagem)?
Passamos o tempo todo a perguntar: porquê que o DT reage assim, porquê que responde à insolência, porquê que em vez de se calar, ou mandar calar, arrisca confrontos verbais e até físicos obviamente perigosos, porquê que quer saber, porquê que se interessa, porquê que não desmente sendo que mentiram sobre o que disse, porquê que disse o que não deveria ter dito, porquê que não se defende...em suma, afinal será que age por convicção ou «em gestão», ou por intuição - ironicamente uma das primeiras palavras que analisa com os alunos? Porquê que não desiste? Às vezes, isso é claro, outras nebuloso.
E as perplexidades somem e seguem. Manifestamente gosta dos alunos, não só num sentido estritamente académico, mas quase como filhos : estimula, desafia, mas também embirra, provoca, deixando-se levar pelas insolências até se lembrar que as tem de fazer parar; fala com uma notável presença de espírito, mas descontrola-se também depropositadamente...tudo controlado, tudo descontrolado.
A pecha da escola pública explicada a adultos que querem ver para além da côr da pele, da linguagem, da recusa na aprendizagem, do desespero/esperança de se querer ensinar muito e acabar por perceber que os alunos levam dali bem pouco...ou talvez não...
Notável. Desassombrado.Muito estimulante, mesmo.
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