Do fundo do corredor do supermercado, pareciam um casal jovem apenas embrenhado na decisão da marca de leite a levar para casa. Ela, de uma simplicidade incomum feita de bom gosto, vagamente ajoelhada ao lado dos pacotes; ele, alto e bem constituído, corpo trabalhado provavelmente num ginásio da moda, olhava-a, segurando o cesto ainda para as primeiras compras. Podiam ser personagens de um filme francês.
Por nada, a minha atenção auditiva fixou-se na conversa deles, pelo instante de apenas três passos em direcção à zona dos congelados.
-Se continuares a achar que olho para todas as mulheres...
A minha alma estacou. A voz dele baixa e serena, mantendo a pose de banalidade quotidiana. Ela, silenciosa, retirando do plástico os pacotes finalmente escolhidos, como se ele não tivesse dito aquilo. Aparentemente, nada mudara entre o fundo do corredor e aqueles três passos.
Duas voltas mais e dirijo-me à caixa. Reparo que estou atrás deles. Ele sai de cena, porque se esquecera de algo. Ela olha-o por uns segundos, e volta-se para a frente. Estaquei de novo. Nas costas descobertas dela, entre as alças de um vestido de ganga delicioso, uma tatuagem em letra elegante:
«Finalmente, encontrei o meu anjo da guarda».
2 comentários:
Quem vê caras ...
...e tatuagens...
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