Ai Europa!
Há coisas muito estúpidas de se pensarem, e uma delas é a de que não vamos naufragar porque o buraco está do outro lado do navio em que viajamos.
Os povos do norte da Europa indignam-se com a nossa inépcia governativa, e regozijam-se com as medidas de austeridade que nos foram impostas.
Já é comum dizer-se que, objectivamente, a questão é se o norte da Europa não deveria certificar-se se a excessiva austeridade e a descredibilização do sul não afectará a economia europeia como um todo, e cada nação em particular.
Por outro lado, que ganhamos nós, portugueses e gregos - mesmo que à beira de um ataque de nervos, por nos vermos, e sobretudo aos nossos filhos, sem perspectivas mínimas de futuro - em saber os holandeses, os alemães, os franceses ou os finlandeses a afundarem-se?
Vem isto a propósito de uma notícia recente do Público intitulada "Austeridade leva à queda do Governo na Holanda". A notícia, carregada de subjectividade, dá o mote: é uma ironia os holandeses recusarem para eles a austeridade que exigem aos países do sul. Nos comentários, pipocaram lugares comuns, como se fosse importante saber de que lado o barco abriu a fenda: é bem feito, provam do seu próprio veneno, o desemprego e a miséria deviam disparar por aquelas bandas, quem tem telhados de vidro não deve atirar pedras....
Uma Europa a preferir trocar argumentos frívolos e perigosos - indignos dos ideais que sustentaram a criação da actual União Europeia -, a procurar uma eficaz conjugação de esforços, é um déjà vu que os políticos de todos os países têm a obrigação de prevenir e os seus cidadãos de recusar liminarmente.
Uma amiga minha foi recentemente a Macau, a uma feira internacional, e não obstante ser portuguesa, ninguém comentou "Portugal não está nada bem"; constatavam ao invés, "aquilo na Europa está mau!".
Os europeus do norte e do sul são a tal "Europa" de que falam os orientais, e era o que nos faltava que a crise alastrasse aos países do norte: tornaria a União Europeia politica e economicamente ainda mais vulnerável do que já está, e em nada aliviaria as crises portuguesa ou a grega.
A Europa aprendeu em três séculos a lutar com os autoritarismos políticos, usando de solidariedade e integridade na defesa de valores humanistas de que ainda hoje beneficiamos. Será lamentável que não aprenda rapidamente também a usá-las como armas contra o autoritarismo económico.
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1 comentário:
Ora nem mais!
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