Porto e Lisboa: procure as diferenças, encontre as semelhanças


Fui passar alguns dias da semana passada ao Porto. Sentia pena de ter sempre ido ao Porto apenas de passagem ou em trabalho, e não assim por três ou quatro dias, pelo menos, como se usa fazer para visitar qualquer outra cidade europeia.

Não vou gabar as virtudes das belezas patrimoniais e naturais do Porto, que são todas aquelas que lhe conhecia, e muitas mais que me vi na agradável contingência de lhe reconhecer. Quem, ao fim de uma tarde de Verão, já bebeu um copo ou jantou no cais da Ribeira, a olhar Gaia dourada  realçando lentamente os néons das caves do vinho do Porto, enfadar-se-ia; quem nunca visitou, por exemplo, as deslumbrantes igrejas de S. Francisco e Santa Clara, pouco ganharia com as minhas descrições incipientes, e bastante aquém do que a cidade mereceria, pelo que delas me vou dispensar.

Duas notas, apenas, portanto. O Porto é o Porto. Nada tem a ver com Lisboa, e não há nada de mais absolutamente inútil, vazio e enfatuado que o exercício de procure as diferenças e encontre as semelhanças, no que respeita a gentes e património. São mesmo diferentes e ai que bom.

No entanto, no Porto, dei por mim a perguntar-me, como já me tem acontecido em Lisboa, se alguém "tirara o som à televisão". Confirmaram-me que havia muito menos trânsito e, um dia que saí mais cedo do hotel, percebi que se andava de transportes públicos e sobretudo a pé.

Mas não era só isso. A não ser as vendedeiras do Bolhão, que pareciam cumprir um ritual a soar a falso do ó menina não quer alguma coisinha e, na Praça da Batalha, uns passantes meio bebidos que "mandavam bocas" contra o ministro Relvas, nem os próprios manifestantes, que empunhavam toscos cartazes a dizer que o ministro atravessara a estrada para fazer Erasmos, produziam qualquer ruído audível a mais de dois metros.

Nos cafés, os empregados eram cordatos, mas falavam baixo. Nos transportes, ninguém conversava a não ser, por vezes, ao telemóvel. Dava a sensação que toda a gente pisava ovos ou caminhava mesmo um palmo acima do chão.

Hoje, ao ler a crónica de José Vítor Malheiros, no Público, confirmei que o país deve estar todo assim - ele vê depressão onde eu talvez prefira ver uma indizível perplexidade, mas as conclusões pouco diferem.

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