Já estamos a chegar?


O T. , na aborrecência dos 14 anos, vinha ontem no carro a queixar-se: duas hora de viagem para fim de férias na aldeia. Optáramos pela A14, seguida da A17, o que significa que a viagem seria um pulinho em autoestradas praticamente desertas, construídas com três faixas, prevenindo um crescimento económico improbabilíssimo.

Os meus pais e eu só nos ríamos. De que te queixas tu, miúdo? Tu sabes lá o que era viajar "lá para cima" quando eu e o tio éramos pequenos? E enumerei: as curvas de Alenquer - de que o presépio gigante era o único atractivo, e ainda assim porque nos contentávamos com bem pouco; as curvas de Rio Maior atrás dos camiões que o pai insistia em ultrapassar, creio que para se entreter, para desespero da mãe. O frango na púcara em Alcobaça se a coisa corria bem, mas chegávamos mesmo a ter de almoçar no Carregado ainda.

E depois era viajar, viajar, viajar parecia que até à eternidade. Chegávamos ao destino quase à noite, por estradas esburacadas e, por vezes, até por trancos e barrancos já que a alguns troços faltava mesmo alcatrão. E os miúdos que éramos nós, lá atrás, sem cinto de segurança, aos gritos e desafios constantes entrecortados pela desesperante cantilena "já estamos a chegar?".

O meu pai  riu-se e comentou: e vocês ainda tiveram sorte. Aqueles primeiros 25 km de autoestrada a partir de Lisboa fizeram grande diferença. Sabem lá o que era antes disso.

O T. engasgou... e eu também. É verdade, confirmei agora na Wikipedia: os primeiros 25 km de autoestrada Lisboa-Porto foram inaugurados apenas em 1961, alguns anos, poucos, antes de eu nascer, portanto. Só em 1977, três anos após o 25 de abril e nove anos antes da nossa entrada para a então Comunidade Económica Europeia, foi concluído o troço Vila Franca de Xira-Carregado, de apenas 6 Km.

Só em 1991, a A1, que liga as duas maiores cidades do país, ficou integralmente concluída com a entrada em serviço do troço Torres Novas-Condeixa. É certo que podemos dizer que andámos de cabeça perdida durante muitos anos, mas lembrar-me do suplício infantil daquelas viagens de um dia inteiro, relembra-me que partimos de um nível muito (demasiado) baixo.

Sem comentários: